Seu psicólogo me ligou ontem querendo conversar. Quase tive um infarto ao imaginar que alguma coisa pudesse ter te acontecido, mas ele disse que você está bem. Hoje fui lá e ele me entregou uma carta. Pelo que entendi era um exercício e ele pediu que você a escrevesse justamente com a intenção de me entregar. Não quis ler na frente dele. Enquanto caminhava rumo ao escritório tentava adivinhar o conteúdo daquele envelope. A curiosidade era enorme, mas o medo ainda era maior... Estou no meu cubículo e acabei de lê-la. Não queria responder agora, no calor do momento, mas ao mesmo tempo não quero deixar os pensamentos e as respostas irem embora ou perderem força. Sempre senti um puta orgulho de você e das coisas que você escreve. Você sempre foi tão boa com as palavras, mas estas - carregando suas dúvidas e medos - só ajudaram a me estraçalhar ainda mais por dentro.
Minha vontade agora era a de estar bem aí do seu lado compartilhando da sua dor e vivendo a nossa vida. Mas isso só faria com que o seu sofrimento, suas incertezas e medos aumentassem. Eu estaria de corpo presente, mas minha cabeça continuaria presa no labirinto em que eu mesmo criei e me perdi. Sozinho... E você continuaria se sentindo culpada quando na verdade você é a vítima. Falhei miseravelmente quando você mais precisou e ainda precisa, mas te olhar virou um suplício. Porra, eu já me sentia tão culpado pelo acidente, pelo motivo besta com o qual te questionei, por não ter entendido o seu afastamento, pela sua dependência de mim. A cada cirurgia sua fui perdendo a fé no homem que eu acreditava ser... Sinto uma dor excruciante por ter sido o responsável por toda essa merdarada que está acontecendo com você. Eu é que deveria estar sendo remendado, costurado e o caralho a quatro. Não você! A minha vergonha era e ainda é tanta que eu não aguentei mais olhar nos seus olhos - sempre tão compreensivos - e dar de cara com o homem de merda que eu me tornei. Não que você me veja dessa forma, mas foi como eu passei a me enxergar. Justamente nos olhos da minha mulher...
Não sei o porquê saí de casa. Covardia? Culpa? Me senti tão pequeno. Não vi outra saída e ao tentar facilitar as coisas dificultei ainda mais. Não pensei que você fosse se sentir assim tão abandonada e descrente. Imaginei, estupidamente, que o afastamento fosse nos beneficiar de alguma forma. Mas é lógico que iria voltar. Errei ao decidir isso sozinho, errei ao pensar que você não poderia me ajudar. Errei porque deixei de me comunicar com você quando a conversa poderia ter facilitado todos os nossos tormentos...
Sinto tanto a sua falta... Queria poder deitar no seu colo e esquecer de mim e de tudo enquanto você mexe no meu cabelo. Ouvir e fingir que entendo suas neuras e rir por dentro em função delas. Gosto de te ver cantar fora do ritmo e desafinada quando está feliz. Te ajudar - ficando acordado - em suas crises de insônia. Fazer compras no supermercado enquanto você coloca 1, 2, 3 barras de chocolates, 1 ou 2 pacotes de balas no carrinho imaginando que eu não perceba. Sentir aquele friozinho na barriga ao olhar para sua cara emburrada e ter a certeza de que eu fiz alguma cagada. Observar você fazendo palavras cruzadas antes de apagar a luz pra tentar dormir. Ou da sua concentração sobrenatural quando está lendo um livro ou filme que goste muito. Decora falas, repete-as pra mim. Sinto falta das suas demonstrações de carinho gratuitas depois de um dia infernal de trabalho. Da forma como prepara o meu banho, da forma como cuida de mim. Dos seus beijos na minha testa, no meu queixo, nas bochechas e orelhas... Aliás, sinto falta de você inteira. Do seu calor, das suas mãos delicadas, do seu corpo que me enlouquece. Te amo tanto... Mesmo que nem sempre consiga demonstrar... É claro que eu vou cuidar de você, amor. Mas antes preciso voltar a acreditar em mim. Me ajuda?
Eu voltei. Estou aqui na sua frente, de joelhos, enquanto você lê essa minha resposta e chora compulsivamente... Quero te abraçar, te beijar e conversar sobre a gente. Meu medo, meu único medo é perder aquilo que eu tenho de melhor e que é justamente você... Me perdoa? Quero me sentir completo novamente, mas isso é impossível sem estar ao seu lado...
O espetáculo da vida!
Há 5 anos
2 comentários:
Caralho!!!!!! Foi o teu melhor texto, srta! Fiquei um pouco perturbado, sério mesmo...
Parabéns!
beijo,
Muito obrigada!
Te falei que o meu 'eu masculino' é meio puto, mas de certa forma ficou verdadeiro! Eu acho que esse cara existe e a situação é real. :)
E você tente fazer essa inversão de papéis um dia. É muito legal! Até mesmo porque bate de frente com as suas convicções! É um ótimo exercício... Eu, por exemplo, prefiro o meu ladinho macho e puto ao melosinho e sofredor da mulher! hahahahahaha
Beijos,
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