quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Cadê você?

Você me disse para escrever minhas idéias e sentimentos numa folha de papel, pois fluem melhor. Talvez você tenha razão. Apesar da pressa e do garrancho - ao qual tenho a coragem de chamar de letra - os sentimentos tornam-se claros como o verde dos seus olhos. "Aí vai a sua porção de piadinhas diárias como parte do tratamento, baixinha". Não tem depressão que resista ao seu esforço. Mesmo a vontade sendo a de chorar você conseguia me arrancar gargalhadas com as tirinhas infames do Dr. Pepper. Sempre me largava uma mensagem no msn com pensamentos positivos e querendo saber como eu estava. Mesmo longe, sua preocupação para comigo sempre foi real e sincera. Desde lá trás. Já não conseguimos falar com a frequência de antes, mas fazemos questão de lembrar ao outro a nossa existência. Continuo sempre aqui, polaco. Quando puder e tiver tempo, me chame... Quando finalmente conseguimos nos cruzar na nossa correria - mais sua do que minha - não perdemos tempo com nossas lamentações ou frustrações profissionais. Nem parece que o tempo passou, nem parece que ficamos meses sem trocar palavras. "Você é péssima pra se esconder, invocadinha. Sei exatamente quando está aí". Rimos das nossas besteiras, das piadas, da nossa vida, das nossas desgraças, mas sempre crentes de que tudo pode piorar. E é exatamente por isso que até estamos bem, eu diria.
Hoje passei boa parte do dia pensando e conversando com você. Escrevendo, lendo seus textos e rindo das nossas barbaridades. Gosto de você porque você me aceita e me respeita como sou: uma baixinha maluca e invocadinnha. Nunca precisei te passar uma imagem que não fosse verdadeiramente a minha. Você fez o mesmo comigo. Sabemos dos nossos defeitos, assim como nossas qualidades. Nos respeitamos e nos admiramos por aquilo que somos: amigos, autênticos e reais.
Quando disse para escrever minhas idéias e sentimentos no papel, pois tudo flui melhor, você acertou. Escrevi esse texto em menos de 15 minutos, tamanha a minha amizade e admiração para com você, general.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Plural

Hoje é o dia mais feliz da minha vida. Não consigo pensar em nada que tenha superado o atual momento. Assim que abri o resultado do exame e me vi grávida* chorei de tanta emoção. O sonho - o maior de todos - estava crescendo bem ali dentro de mim. Depois do choque, da euforia inicial, do susto e de todas as sensações conflitantes dignas de uma gravidez não planejada, pensei em você. E me deu medo. Muito medo.
Medo porque a nossa relação é conturbada. Depois de inúmeras idas e vindas finalmente estamos vivendo um momento de paz. Paz que custou a reinar. Às vezes é difícil entender como as nossas diferenças podem ser nossas mais fortes aliadas para que permaneçamos juntos. O que nos derruba é justamente aquilo que somos e queremos de comum acordo. Como se o fato de não estarmos morando no loft dos nossos sonhos fosse somente minha culpa (por não ter grana para pagar o aluguel). Ou como se o fato da gente não conseguir fazer aquela viagem de 1 mês pela Europa fosse somente culpa sua (por nunca ter tempo disponível). É fácil jogar nossas frustrações ou nossos medos em cima um do outro. Aí a raiva aparece mostrando a sua cara, a indiferença aparece mostrando a minha. Acabamos nos separando mais uma vez porque é o caminho mais fácil e cômodo. Só que não conseguimos ficar longe por muito tempo. Não sei se o que vivemos é realmente amor ou se é dependência pura. Mas sempre voltamos ao nosso pequeno ciclo vicioso de amor, paixão avassaladora e uma pitadinha de ódio que, dependendo dos casos, até faz bem.
O bebê não fazia parte dos planos ainda, mas a gente já discutiu a respeito. Você sabia que era algo que eu queria muito e estava disposto a ter um comigo. Um dia. Também sei que você tem um certo receio, pois não se sente preparado pra ser pai. Sempre disse que não saberia lidar com crianças e que elas dariam um trabalho sobrenatural. Fora os gastos absurdos ou que elas acabariam com a nossa vidinha social pra lá de agitada. O medo que todo pai ou mãe de 1a viagem sente...
Não sei qual será a sua reação. Não espero que, finalmente, me peça em casamento em função da gravidez. Você sabe que não acredito nisso. Filho nenhum segura casamento. Ainda mais nos dias de hoje. A gente só casa se achar que deve. Pelo nosso bem. Não sei se você teria coragem de pedir pra eu tirar. Sabe muito bem que eu nunca o faria. Se essa for a sua melhor solução, te largo. Sem dó. Dele eu não abro mão. Mas, depois de muito pensar que você acabaria nos deixando na rua da amargura, resolvi confiar nas diferenças. Aquelas que sempre nos salvaram. Aquelas que sempre nos uniram. Eu sempre quis ser mãe. Você nunca se imaginou pai. Pode dar certo! Vou ser e permanecer confiante como o nosso atual momento merece. Espero que você me aceite como a mãe do seu filho. Ou será filha?


*Aviso aos navegantes: Eu, Letícia, não estou grávida realmente. Tive um sonho e resolvi escrever sobre algo que poderia ser, mas ainda não é. De qualquer forma o sentimento seria exatamente esse ou quem sabe até maior!

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Garotos

Estamos conversando cara a cara e eu sei dizer que a sua vontade é a de me beijar. É algo evidente em seus olhos e seus gestos demonstram certo nervosismo. Seu sorriso é contido. Você fala coisas sem sentido e que não me interessam, pois está com medo do silêncio. Aquele que abre espaço ao beijo. Sei que é a sua vontade, mas você não vai me beijar. Não vou dizer que te falta coragem, acredito que seja uma questão de respeito. São quase 10 anos de diferença. A única explicação plausível é a de que eu sou uma mulher e você é um garoto. Poderia facilitar a sua vida e eu mesma partir para o ataque. Por que não? Sou uma mulher de atitude que nunca negou suas vontades e você é maior de idade. Poderia facilitar, mas não vou.
Enquanto você fala, penso nos outros 2 garotos que cruzaram o meu caminho recentemente. Nunca tive algo contra (mentira, pois tive um trauma enorme na adolescência), nem a favor de relacionamentos com diferença enorme de idade. Mas, depois de muita conversa e 15 anos após o maldito trauma, acabei cedendo a minha própria curiosidade. O primeiro era garoto, mas tinha cara e atitude de homem. Era novo, mas sabia muito bem o que queria. Cheio de convicções e não fazia promessas despropositadas. Ele sabia que eu não cairia em qualquer ladainha porque àquela altura eu era uma das pessoas mais desconfiadas da face da Terra. E no entanto, com ele me senti mulher de verdade. Ele até me ajudou em uma ou outra crise existencial. E ele nem tinha idade para saber o que era isso! É alguém incomparável e dele eu tenho saudade. O segundo tinha cara de menino, mas não sabia exatamente em que estágio estava: se ainda era o garoto pegador e que tentava impressionar os amigos ou se era homem o suficiente para prestar atenção e dedicar-se a impressionar uma única garota. Gosto de mulheres mais velhas, ele dizia. Claro que gosta. Elas são diretas, desafiadoras e de tapadas não têm nada. Ou quase nada. É lógico que você gosta, vai ganhando experiência, né espertinho. A lábia dele era forte. Algumas atitudes também. Mas este, estava mais preocupado na quantidade do que na qualidade. Pega e come quem você quiser, novinhas ou velhas, mas já pode me deixar em paz, viu? Eu 'si cansei' dessa conversinha mole. Não tenho mais saquinho.
Não tenho como dizer em que lado da moeda você cairia. Mas também não pretendo pagar pra ver. Pelo menos você tem noção de que qualquer idiotice que você faça, por menor que seja, pode te comprometer. Maturidade não tem nada a ver com a idade. É uma questão de vivência. Muitos homens com seus 30, 40 anos têm mentalidade adolescente. E não tem nada mais frustrante ou broxante que isso: a falta de maturidade em quem, teoricamente, deveria ter...
Poderia beijá-lo. Facilitar a minha vida ou a sua. Mas não vou. Cedo ou tarde você vai ter que lidar com suas próprias in(decisões). E eu é que não pretendo apressar ou interromper suas escolhas.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

É assim que é...

Ainda estou acordada e lutando com todas as minhas forças para me manter assim. Sentada na poltrona junto à cama, observo você dormir. Agora só me resta guardar na memória aquilo que minhas mãos, lábios, pernas e nariz sentiram em contato direto com o seu corpo. Tento capturar como uma máquina fotográfica cada detalhe minúsculo e que por ventura tenha passado despercebido tamanho o nosso desejo e afobação de horas atrás. Difícil tentar determinar a reação que você causou para cada um dos meus sentidos. Com minhas mãos percorri seu corpo inteiro entre toques suaves e vigorosos. Era essencial, como se me provassem que você realmente estava ali. Sua pele tão macia e branca feito leite contrastava com a minha que é morena. Reparei nas pequenas sardas dos seus ombros e que arranhei de leve como se pudesse apagá-las dali. Seu cheirinho de pêra me fez querer te lamber, morder e chupar feito fruta madura. O tempo todo. Meus lábios molhados percorreram cada pedacinho do seu corpo sem secarem uma única vez. Descobri que aquela sua marquinha abaixo do umbigo é irresistível. Minhas pernas, apesar da diferença de altura, procuravam o encaixe perfeito entre as suas. Você buscava me ler tanto quanto eu. Sua barba cerrada e me arranhando inteira de cima abaixo me levou à loucura. Seus beijos se alternavam tanto que eu já não conseguia corresponder à minha própria urgência de você. Seu hálito de cigarro, disfarçado pelas balas de menta, refrescavam a minha boca quente e sedenta. Seus dedos compridos e delicados sabiam exatamente onde eu queria e precisava ser tocada. Seus olhos me diziam todas as coisas que sua boca não conseguia e nem podia dizer na hora...Você apareceu do nada na porta da minha casa. Mal entrou e já foi me agarrando, arrancando minhas roupas com violência enquanto me beijava furiosamente e me apertava contra a parede, contra você. Cedi na hora. Formalidade pra quê? Já esperamos tempo demais... Só queria saber e sentir o seu corpo colado e transpirando junto ao meu e em perfeita sintonia. Até o fim. Foi uma briga de igual pra igual onde os dois sairam vitoriosos, mesmo que o atual cansaço mostre o contrário. Agora, estou aqui sentada e bebendo uma cerveja pra me acalmar. Não sei quando irei vê-lo novamente e eu preciso guardar esse momento com a maior riqueza de detalhes possível. Não posso e nem quero dormir. Quero estar acordada quando você for embora...Velando o seu sono tenho a certeza de que poderia ser mais do que isso. Respiraria, transpiraria, me alimentaria de você todos os dias, todas as horas, por tempo indeterminado... Mas eu só tive uma noite pra isso, pois amanhã você já está indo embora e não sei quando e se pretende voltar...

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Um sonho que se sonha junto...

Faz alguns anos que não nos vemos e temos falado muito pouco. Você mudou de mala e cuia para a França e pelo que me consta, não parece querer voltar. Sua vida de escritor renomado tem tomado muito do seu tempo. No entanto, não posso deixar de te contar a novidade. Saiba que ao menos um de nossos sonhos saiu do papel. A nossa livraria está de pé e é exatamente do jeito que imaginamos um dia. Foi difícil no começo, pois a idéia sempre foi que a construíssemos e mantivéssemos juntos, mas já não tinha certeza da sua real vontade. Nosso mundinho está localizado em uma estrutura toda de tijolinhos. O espaço é lindo e não tão pequeno como o previsto. Consegui implantar as minhas idéias, sem esquecer-me das suas. Nada de abrir filial de alguma grande rede, nada de modernidades e distanciamentos para livros que vêm se mantendo ao longo de séculos. Estantes de madeiras, livros acessíveis e variados, atendentes solícitos. O tempo todo. É um cantinho perfeito. Não sei como descrever, mas imagine aquela sala de estar abarrotada de livros, almofadas coloridas para se ler deitado e algumas poltronas. As bancadas centrais respirando História, as paredes com quadros cheios de versos ou pinturas. Já não consigo mais ficar longe. Respiro, transpiro e me alimento de todo aquele saber 'semi embutido' nas estantes que são da cor de chantily. Temos uma programação cultural diferenciada. Principalmente para os idosos. Adoram os saraus e eu tenho me esforçado na minha péssima oratória. O que importa é que eles sentem-se em casa aqui. Acho que o que mais atrai nosso público é o fato de nossos exemplares poderem ser lidos sem a obrigação da compra. Se gostar, leva! Se não gostar devolve e muda o foco! Uma hora acha. A meta principal nunca foi a de lucrar horrores em função dos livros, mas fazer com que as pessoas criassem hábitos de leitura e viajassem a universos antes desconhecidos. Como a gente fez e ainda faz. É por isso que damos atenção especial às crianças. Se você apenas soubesse o papel de palhaça que eu faço nas oficinas ou encenações, ficaria horrorizado. Ou admirado, não sei. Parece bobo, mas na maior parte das vezes fico imaginando como seria ter você aqui. Sei que se ocuparia absurdamente nas estantes e bancadas dos clássicos, os seus preferidos. Poderia passar horas ali espanando e colocando os livros em ordem; lendo as orelhas de edições novas ou de exemplares que ainda nem chegou a devorar... Ao olhar para o lado me encontraria fácil nas estantes dos romances e escritores latino-americanos, os meus preferidos. Escolheríamos livros ainda não lidos, para no fim do expediente, nos encontrarmos nas mesinhas de café (sim, temos uma cafeteria minúscula, mas que faz toda a diferença). Comentaríamos sobre o nosso dia; discutiríamos formas de manter a 'casa' em ordem e as novidades das editoras. Você até poderia ter suas tardes e noites de autógrafos bem aqui. No seu lugar... É engraçado, mas hoje vejo que não tenho apenas o melhor trabalho do mundo. Eu simplesmente vivo esse mundo. Nunca havia me sentido tão realizada como agora... Saiba que quando vier e se vier, as portas - com a sineta anunciando - estarão abertas para você e o pão de queijo estará quentinho. Nossa livraria, como você mesmo previu, fica ali mesmo: just around the corner...
Um beijo com sintomas de saudade,
Srta.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Cor dos olhos

Não sei por que procuro avidamente cruzar nossos olhares. Será que me faria algum bem encontrar as respostas que procuro? Sua expressão fechada e ferrenha esconde tudo aquilo que preciso saber, mas sei que seus olhos não te deixariam mentir. Sim, porque você esconde algo. Eu sinto. A gravidade, eu não sei. A intensidade, muito menos. A dor que pode causar? Eu faço idéia. Não tenho medo de encontrar suas mentiras, muito menos suas verdades. Talvez conseguisse enxergar quem você realmente é ou quem pretendia ser. Enxergar nosso início e fim ou o porque da nossa 'sorte'. Pra que, você rebateria.
Quer esconder algo? Então alie-se à palavras escolhidas cuidadosamente e a gestos comedidos, mas não espere que seus olhos sejam coniventes com o que seu corpo diz e ao que sua boca pronuncia. Não cabe a eles esconder o que quer que seja. Se você mente, não me olhe nos olhos. Se me deseja, fixe-os em mim. Se você sofre, teme ou está aflito, não precisa chorar. Se está cansado ou desesperançado, acredite: vou saber. É uma questão de leitura.
Quando disse que não temeria nada ao cruzar seu olhar, menti. Não tenho medo que você me leia da mesma forma, pois sei que meus olhos continuariam me entregando de mãos beijadas a você. Olhar é entrega: velada ou consentida. Minhas alegrias e tristezas até uma criança perceberia. A aflição ou a calma de um único momento de paz também. Das minhas seguranças e inseguranças você sairia expert. Meus desejos mais loucos e sinceros já não seriam mais segredo. A minha até então indiferença não teria passado despercebida...
O que temo é não conseguir me achar em seus olhos. Já cruzei olhares onde eu deveria estar e não me encontrei. Dei de cara com um olhar vazio e que não me dizia nada... Ou enxerguei um brilho diferente e que já existia, mas não por minha causa. E isso dói, pois nenhum olhar consegue esconder a existência de uma outra pessoa. Nem o mais dissimulado dos olhares. Nem o mais frio dos corações. Faz tempo que não nos vemos e, apesar de todo o carinho, esse é o meu maior e único medo.
Nunca me deixei enganar pela cor dos olhos de alguém. Como se olhos claros fossem sempre mais claros e olhos escuros sempre mais obscuros. Todos possuem brilho e opacidade em maior ou menor grau. Fixar-se a cor dos olhos é apaixonar-se por algo que talvez não seja. É superficialidade. É apenas cor. Olhos claros, verdes ou azuis nem sempre são tão transparentes. Podem ser os mais confusos e difíceis de ler. Olhos castanhos ou escuros nem sempre são os mais sombrios. Podem ser os mais cristalinos e diretos. O que diferencia e atrai é o que está por trás. Consequentemente, o que machuca também.
Não me importo com a cor dos seus olhos. Gosto dos olhos sinceros e destemidos como os meus. Aqueles que se entregam em união aos gestos e palavras. O dia que você cruzar o seu olhar 'colorido' com o meu olhar castanho, você vai saber do que eu estou falando. E eu vou saber o que você tanto esconde.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Seu lugar é aqui...

Por muito tempo ela evitou cozinhar, lavar louça e roupa, passar, varrer e tirar o pó, limpar banheiros e vidros, mas isso foi antes de morar sozinha. Agora, ela era a rainha do seu próprio lar e mesmo que pudesse deixá-lo jogado às traças, não era essa a sua intenção. Queria os móveis no lugar certo, as louças coloridas, as fotos dando vida à sala, os livros, CDS e DVDS brigando pelo espaço de algumas poucas estantes. Queria a coleção de velas espalhadas pela casa, margaridas brancas na mesinha de canto entre os sofás, uma ou duas plantas de verdade, pois de uma plantinha até ela conseguia cuidar...
E agora ela precisava abrir espaço para as suas coisas. Aquelas que vão chegar hoje e juntamente com você. O lar que era só dela agora vai ser seu também. De vez. Enquanto ajeitava os últimos detalhes percebeu que as tarefas não eram enfadonhas. Suas melhores escolhas foram tomadas lavando um prato, passando um pano no chão ou olhando o cronômetro do micro-ondas enquanto a lasanha não descongelava. Ela aprendeu que cuidar do lar é cuidar de si mesmo. E ela estava mais do que disposta a fazer tudo isso por você. Ou melhor, quase tudo. Cozinhar continua sendo um tabu, mas graças aos congelados e deliveries de fome você não irá morrer.
Agora vocês vão construir a vidinha que sempre quiseram e ela vai poder cuidar de você como sempre quis. Antes de sair para o trabalho deu uma olhada para aquele canto que um dia tinha sido só dela. Como você vai chegar antes, ela deixa um bilhetete no quadrinho de recados grudado à geladeira:
Amor meu,
Não deu tempo de fazer as compras! Passei a manhã liberando espaço nos armários. Hoje tenho reunião então vou demorar.
Amo tu...
PS: Pede uma pizza ou descongela algo porque eu vou chegar varando de fome!
A caminho da loja lembrou que tinha esquecido de te deixar as boas vindas. O básico! E você teve a capacidade de esquecer, lamentou-se. Mas isso já não importava, pois a partir de hoje você vai sempre estar lá quando ela chegar. E ela está mais do que feliz em função disso. O seu lugar, definitivamente, é ao lado dela...

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Calcinhas

Se algum dia eu me acidentar e precisar de uma operação urgente, não vou querer ir para o hospital usando uma calcinha bege, tamanho família ou rasgada! Já imaginou se o médico é um gostosão e é obrigado a ver o quanto você não se preocupa com a aparência da sua lingerie? É o cúmulo! Parece piada, mas depois que ouviu essa ladainha da boca de alguma amiga ela passou a cuidar minuciosamente de suas roupas íntimas. E deu graças a Deus por isso.
Tudo bem que acidentar-se era a última de suas vontades, mas é sempre melhor estar prevenida. Ou não. Por exemplo, VOCÊ nunca deveria ter visto as minhas belas calcinhas. Se estivesse usando uma horrorosa aquele dia você nunca teria tido acesso ao meu país baixo. Eu não teria permitido. Culpa da calcinha! A bege, tamanho família e rasgada teria sido a minha salvação. Mas não, lá estava eu - bela e formosa - com uma calcinha toda delicada e que você adorou. Merda! Você não era o médico gostosão daquela ladainha e eu nem precisei me acidentar para que você pudesse vê-la. Escolhi a lingerie perfeita justo pra você que não tinha nada a ver com a história!
Moral do post: cuidado ao escolher as suas calcinhas, pois as beges e broxantes podem ser a sua salvação em momentos pra lá de críticos e tentadores. Elas podem evitar com que você faça uma bela de uma cagada. E ainda por cima com a pessoa errada.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Game Over

Ela estava vivendo apenas o quarto dia do inferno na terra. Difícil sobreviver àquela semana sem queimaduras de 1o, 2o ou 3o graus. O trabalho monótono, o despejo do apê e tudo aquilo que ela conseguiu perder neste curto espaço de tempo não pareciam suficientes. As mudanças foram drásticas e ele resolveu ter uma 'conversa séria' naquela semana maldita. Enquanto ela se torturava com seus pensamentos ou a falta de lucidez dos mesmos, ele dirigia calmamente pela cidade. Estava levando-a para o bar em que se conheceram 2 anos antes. Teria sido romântico, se a intenção dele não fosse terminar aquele relacionamento pra lá de conturbado. Ela já sabia do fim, só estava esperando que ele tivesse a capacidade de comunicá-la.

Pararam duas quadras antes do local. Ele abriu a porta do carro para ela descer. Quase não sentiu o chão, pois mesmo estando psicologicamente preparada para o fim - que ele decidiu e sem consultá-la -, a escolha do local foi um tremendo golpe baixo. Como não lembrar do dia em que se conheceram? Ela estava sentada em uma banqueta, bebendo cerveja e pensando em todo o trabalho que tinha deixado sem o menor peso na consciência. Ele surgiu do nada e sentou-se ao seu lado com uma cara de 'que dia infernal' maior que a dela. Na brincadeira e na inocência, ela colocou em prática uma vontade que sempre teve: a de cantar um homem com a famosa Oi, tudo bem? Você vem sempre aqui? e arqueou as sobrancelhas pra complementar. Antes que ele pudesse responder ela já estava rindo de vergonha. Não sabia se ele entenderia a brincadeira ou se ela era realmente péssima na 'arte de seduzir'. O fato é que conversaram horas a fio: desde as banalidades convenientes até os assuntos mais complexos e dignos de significado. Até que ela não resistiu e o beijou. Sem pedir licença, sem avisar, sem saber o que se passava naquela cabeça e o que ele realmente queria. Foi simples assim. O momento deles foi marcado assim. Isso e tudo o que se seguiu após - de bom ou de ruim - , estava para ser deixado dali alguns minutos...

Foram andando lado a lado e ela sentiu falta do toque e o entrelaçar de mãos. Falava algumas amenidades, mas ele não era muito fã de 'small talk'. Suas respostas eram mecânicas e desinteressadas o que fez com que ela desistisse de tentar. Pararam junto à marquise. O coração dela estava acelerado. O que quer que você diga eu já sei. Eu só preciso não me abalar além do que me é permitido aguentar, pensava. Enquanto ela mentalizava formas de se mostrar e conseguir ser forte ele começou a falar. Ela olhou ao redor implorando para que algo ou alguém a arrancasse daquela calçada. Era o único lugar em que ela não queria estar. Ele continuava a falar, mas parecia dizer coisas ininteligíveis e desprovidas de som. Ela fixou o olhar em seus lábios para tentar ler e compreender aquilo que era incompreensível aos olhos, ouvidos, mente e coração. O mundo movia em camêra lenta e ela era a pressa que já não fazia mais sentido. Pelo menos não no mundo que tinha sido deles...

Por que diabos não quer entrar? A escolha do local foi sua! ela gritava por dentro. Ele nem ao menos a olhava nos olhos. Com as mãos no bolso e olhando ora para o chão, ora para os lados, falava tudo aquilo que julgava importante. Ela apenas o observava. Como pude amar alguém tão frio e distante? Sabia que tinham diferenças enormes, mas elas não eram o problema. As imperfeições do próprio corpo e personalidade que tanto a atraíam, muito menos. O problema foi ele ter deixado de acreditar... Não nela, nem nos dois, mas nele próprio. À medida em que se desligava daquele momento, o céu escurecia sobre a cidade. Alguns trovões eram ouvidos ao longe. Vai chover, ela vibrava por dentro. Logo, pingos enormes e espaçados começaram a cair do céu e ele continuava proferindo aquele discurso premeditado que ela já não fazia mais questão de ouvir. Ela saiu debaixo da marquise, abriu os braços enquanto os pingos ganhavam velocidade. Começou a girar e a girar sem parar. Ele gritava, implorando atenção, mas ela já não se importava. Respirou fundo e disse: Não precisa dizer mais nada. Eu já entendi. Você vai continuar a sua vida sem mim. Tudo bem, você está livre. Pode ir... Foi embora caminhando deixando-o para trás. As lágrimas tinham sido encobertas pelos pingos da chuva. Era como se ela nem tivesse chorado. Era como se ela desconhecesse o que era dor. Era como se ela não estivesse dando às costas ao amor. Era como se ela fosse livre outra vez. Era como se ela também pudesse recomeçar, pois assim como ele, ela já tinha deixado de acreditar.